Clímax #2: Pré-sal, emissões brasileiras, custo da crise e novas gerações
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Climão da semana
Parabéns a todos, batemos mais um recorde. Mês passado foi o outubro mais quente já registrado.
Meu querido mês de outubro em imagem do Copernicus Climate Change Service/ECMWF
EUA começam a deixar o Acordo de Paris O governo americano enviou uma carta formal à ONU anunciando sua retirada do Acordo de Paris alegando que o cumprimento do acordo traria prejuízos à economia do país. O envio aconteceu na primeira data possível para tal e começa um processo que durará até novembro de 2020, o prazo mínimo para que países efetivamente saiam do acordo e data que coincide com as eleições no país, cujo resultado pode reverter o processo.
Megaleilão do Pré-sal É sempre polêmica a ideia de vender o direito de exploração de petróleo no Brasil. Tem gente gritando "O petróleo é nosso" desde os anos 40, e não foi diferente dessa vez. Acontece que esse debate é sempre baseado em $$$, e a questão é sempre se o Brasil está ganhando ou perdendo a chance de embolsar mais. Mas e se ao invés de calcularmos o lucro, calculássemos as emissões de gases de efeito estufa? A exploração de todos os blocos postos à venda na quarta-feira é estimada em encher 15 bilhões de barris de petróleo o que significaria a emissão de 8,6 bilhões de toneladas de CO2 equivalente. Isso equivale à 2% do orçamento de emissões total do planeta se quisermos ter uma chance de manter o aumento da temperatura média abaixo de 1,5 C. É lucro ou é prejuízo?
Emissões do Brasil Um relatório e análise das emissões de gases de efeito estufa do Brasil foi divulgado na terça-feira trazendo dados muito interessantes cobrindo um período de 1970 a 2018. As emissões do último ano foram relativamente estáveis, com um aumento de apenas 0,3% em relação a 2017 e totalizando 1,939 bilhão de toneladas brutas de gases de efeito estufa. Sem nenhuma surpresa, o setor de mudança de uso da terra segue sendo a maior fonte, com destaque para o desmatamento da Amazônia. Um dado que eu achei estarrecedor é que a emissão per capta do estado do Mato Grosso é o dobro daquela do Qatar, país número um em per capta de acordo com dados de 2014, devido ao desmatamento e as emissões do rebanho bovino. A boa notícia é que houve queda no setor de energia, e pela primeira vez as fontes renováveis não-hídricas se tornaram a segunda principal forma de gerar eletricidade no Brasil, superando as fontes fósseis.
Estamos secando a Amazônia A NASA divulgou um estudo que mostra que nos últimos 20 anos a atmosfera acima da floresta amazônica tem secado, aumentando a sua vulnerabilidade à fogos e secas. Os cientistas também afirmam que tal fenômeno não é natural e sim causado pela elevação dos níveis de gases de efeito estufa, e pelas queimadas e pastagens.
Nada de novo Mais uma vez cientistas nos avisam que estamos vivendo uma emergência. Dessa vez foram mais de 11 mil do mundo todo que assinaram um artigo dizendo que a população mundial enfrenta a possibilidade de sofrimento nunca antes visto se não agirmos rápido. Aqui em português.
Quebrou a internet climática
O grande debate da semana envolveu algumas das vozes mais ativas na luta climática, e começou com uma crítica do cientista Michael Mann ao récem lançado livro On Fire da premiada autora Naomi Klein. O livro (ainda não li mas já recomendo) defende o Green New Deal como solução para a crise climática. De acordo com Mann:
“A sua (Klein) tese é que o neoliberalismo - a política predominante globalmente, que se apoia em privatizações e capitalismo de livre mercado - deve ser derrubado através da resistência em massa. Ela defende que a crise climática não pode ser separada de outros problemas sociais urgentes, todos sintomas do neoliberalismo: desigualdade econômica, vigilância corporativa, misoginia e supremacia branca.”
E é com isso que ele discorda. O cientista acredita que as mudanças climáticas devem ser lidadas separadamente de outras questões sociais. Sua preocupação é que querer resolvê-las em conjunto pode alienar aliados necessários (mais moderados) e que adicionar mais objetivos à um problema já tão grande torna a solução praticamente inalcançável. Ele usa precedentes para defender seu ponto de vista, o caso da camada de ozônio, problema que conseguiu ser (relativamente) resolvido através de acordos internacionais que puderam ser firmados por não incluirem questões sociais.
Instaurou-se um debate no Twitter entre cientistas, acadêmicos e ativistas defendendo cada uma das posições.
Fica a pergunta: existe ação climática sem justiça climática?
O custo da crise
Estudos econômicos acerca dos custos das mudanças climáticas subestimam seu verdadeiro valor, é o que afirmam Naomi Oreskes, autora e professora de história da ciência em Harvard, e Nicholas Stern, presidente do instituto de mudanças climáticas e meio ambiente da London School of Economics em um artigo de opinião no New York Times. E mais interessante que o artigo é a matéria que veio depois, onde os mesmos especialistas respondem à perguntas do público, tocando em questões importantíssimas como produtividade do solo, imigração, a fé cega no crescimento econômico e incluindo o trecho abaixo:
"Muitos negacionistas se consideram defensores da liberdade e da democracia pois têm medo de que as mudanças climáticas serão usadas como desculpa para expandir o papel do Estado levando à perda de liberdades individuais. Mas ao atrasar uma transição ordeira da nossa economia de combustíveis fósseis para uma que não seja baseada em carbono, esses mesmos negacionistas aumentam a chance de que métodos extremos - e mesmo autoritários - sejam necessários para lidar com a crise."
E então eu relembro a minha pergunta anterior, é lucro ou prejuízo?
Refletir e Discutir
"Esse processo de decisão é sobre descobrir o que você quer de dentro para fora, e não em reação à alguma coisa" disse a terapeuta. Ter ou não ter filhos na era das mudanças climáticas? Há muito a ser dito sobre esse assunto e por isso teremos uma edição focada nisso em breve, quando vou querer ouvir a opinião de vocês também (vocês sabiam que podem responder aos e-mails?). Mas esse texto saiu essa semana e é o mais completo dos vários que eu já li a respeito, por isso não resisti e mando agora como um teaser.
“Talvez nós faremos o bastante, talvez não. Mas quando você estiver lendo isso daqui a alguns anos, sob a luz de uma lâmpada movida a energia solar, saiba que seu pai, mãe e milhões de outros que queimaram de amor pelos nossos filhos fizemos o que pudemos, quando nós sabíamos o que estava em jogo, enquanto olhávamos os nossos corações correndo por aí - sorrindo, cantando, brincando e sonhando com o mundo a vir.” Ainda no assunto da nossa dívida com as gerações futuras, esse é o trecho de uma carta que fez parte da instalação “DearTomorrow: A Promise to the Future” em Nova York. Nela, paredes foram cobertas com 50 cartas para as próximas gerações, muitas delas direcionadas aos filhos ou netos dos autores. O projeto também tem um site onde qualquer um pode incluir sua própria carta. Eu sugiro ter um lencinho por perto.
Desastres da semana (sorry!)
Pantanal em chamas
Boa notícia
A Nova Zelândia colocou em lei a meta de zerar suas emissões de dióxido de carbono até 2050, e torna legalmente acordado o objetivo de manter o aumento de temperatura abaixo dos 1,5 C.
Já a Itália tornou obrigatório o ensino de sustentabilidade e mudanças climáticas nas escolas. O assunto deverá ser ensinado para todas as turmas de alunos de 6 a 19 anos por 1 horas por semana. A má notícia é que nenhum outro país já faz isso, eles serão os primeiros.
Recife é primeira cidade brasileira a declarar emergência climática global, assumindo também o compromisso de zerar suas emissões até 2050. Na cidade, onde acontece a primeira Conferência Brasileira de Mudanças Climáticas, foi também lançada a Declaração do Recife, um compromisso para a descarbonização brasileira assinado por todos os estados e o DF além de várias empresas.
Extra
Os jovens do Engajamundo estão buscando apoio para bancar a sua ida à Madri para a COP25 já que tiveram prejuízo com o cancelamento do evento em Santiago. Para saber mais sobre eles e apoiar clique aqui.
Vocês devem ter notado que essa edição está um pouco mais longa, eu tentei descrever melhor o conteúdo dos links - na maioria em inglês - para facilitar o entendimento de todos. É também aos poucos que eu vou acertando qual o nível de entendimento e interesse da maioria. Vamos construindo juntos: se você curtiu ou não curtiu e quiser dar sua opinião, responda ao email e a gente vai se adaptando.
Obrigada pela companhia, até semana que vem!