Clímax #10: Energia solar no Brasil, o risco do clima e... vulcões?
Olá,
Hoje é sexta-feira*, o expediente nem terminou e já teve secretário pulando de penhasco e sinceramente eu estou cansada, e sei que você está também.
É tanto, o tempo todo, tão rápido. Não há tempo hábil para se considerar tudo. Com a newsletter eu queria facilitar as coisas principalmente para quem está focando em outros assuntos mas não quer perder de vista a causa ambiental, mas eu já não sei mais se estou fazendo isso. Estou? Será que eu deveria tocar em menos tópicos por semana?
Ter que priorizar pautas às vezes me dá dor de barriga. Será que eu preciso falar sobre o absurdo de o Extinction Rebellion estar em uma lista com terroristas? Ou sobre mais uma prova de que há muito dinheiro por trás do negacionismo e que as empresas de tecnologia não se importam com o que é dito nas suas plataformas? E preciso mesmo comemorar pequenas vitórias simbólicas como promessas de grandes empresas em fazer algo pelo clima? No último caso acabei optando pelo sim para a Blackrock e não para a Microsoft.
Talvez isso tudo seja só pra dizer que eu sinto muito por atrasar o envio hoje. Alguns dias são mais difíceis que outros.
Sigamos…
*Peço desculpas a todos aqueles que ainda lembram da música da cerveja pelo inconveniente causado. Espero que saia da sua cabeça logo.
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Climão da semana: Edição Nacional
O debate do subsídio à energia solar A recusa do Presidente Bolsonaro em “taxar o sol” deixou muita gente com a terrível dúvida: “ué, será possível que eu concordo com o presidente?”. Mas é claro que essa história não é tão simples.
Vamos começar do começo. Quando você decide colocar painéis solares na sua casa vocês tem duas opções, ou compra uma bateria para armazenar o que é produzido para usar em horários (ou dias) sem sol, ou se conecta a rede de energia elétrica local e para lá envia o excesso de energia gerado durante o dia. Para esse último caso existe um sistema de compensação ou “créditos de energia” que é regulado pela Aneel. É como se fosse um empréstimo de energia que você faz à sua distribuidora que te devolve na forma de um saldo positivo de energia a ser utilizado para abater o consumo na fatura do mês subsequente ou em outro posto tarifário. Ou seja, para você a distribuidora terá papel de bateria ou armazenamento do que foi produzido.
Mas na verdade você está usando a estrutura de distribuição sem pagar por ela ou pelos encargos, como pagam todos os outros clientes de energia elétrica em suas contas de luz, e é isso que estão tentando mudar. De acordo com o Ministério da Economia, se as regras continuarem como são, isso custaria ao sistema elétrico mais de R$ 56 bilhões entre 2020 e 2035, e quem pagaria seriam os outros clientes, aqueles que não tem dinheiro para instalar placas solares em casa. Até aí dá pra entender a lógica, não dá?
A questão é que não se está olhando para os benefícios da energia solar. Deveríamos estar incluindo nesses cálculos os custos de não usá-la, os custos de se usar combustíveis fósseis no seu lugar. Combustíveis esses que, por sua vez, continuam tendo subsídios milionários incontestados e também pagos por todos, mesmo que não os usem.
Se é preciso que se reveja as regras da geração distribuída, que assim se faça, mas que se faça de forma transparente para que seja possível entender esses custos. E que a discussão não pare por aí, é preciso que se criem novos mecanismos de incentivo ao uso de energia solar e eólica.
Quando justificando a proposta, usando o alto valor do custo futuro como motivo, mencionou-se que com esse valor poderia-se construir mais de 9 mil creches ou adquirir 180 mil ambulâncias. Mas quantas mortes por poluição poderiam ser evitadas? Quanto prejuízo devido à enchentes, incêndios ou aumento do nível do mar poderíamos evitar? Talvez se diminuiria a necessidade por tantas ambulâncias…
Opiniões:
Paulo Guedes não quer que você tenha painéis solares em casa (El País)
Nada novo sobre o sol (Folha)
Abrindo as terras indígenas Um projeto de lei que regulamenta a exploração em terras indígenas está sendo finalizado pelo governo federal e prevê a possibilidade de se usar essas áreas para mineração, construção de hidrelétricas e exploração de petróleo e gás com pagamento de compensações aos povos indígenas locais, além de autorizar o exercício de atividades econômicas pelos mesmos. A proposta precisa passar pelo Congresso Nacional e no ano passado o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que não pautaria projetos que flexibilizem mineração em terra indígena.
A mineração já acontece ilegalmente Garimpeiros ilegais já exploram reservas indígenas sem medo como no caso da terra dos ianomâmi em Roraima, onde as operações contam com aviões e grandes máquinas mas os trabalhadores ganham uma miséria e contaminam a si mesmos e aos rios com mercúrio. A Polícia Federal, e com mais frequência o Exército, conduzem operações para combater a exploração de ouro no local, mas os garimpeiros sempre voltam. Para saber mais, o jornal The Guardian visitou a reserva recentemente e escreveu à respeito, e no ano passado O Globo havia feito o mesmo.
Mas os povos indígenas resistem Na terça-feira começou um encontro de líderes indígenas chamado pelo Cacique Raoni no Xingu para estabelecer uma aliança que se contraponha ao governo nacional e resista a medidas como a PL citada acima.
Os dados das queimadas em 2019 O ano passado foi o primeiro em que o INPE verificou aumento de área queimada em todos os seis biomas brasileiros medidos em comparação com o período anterior. Em um ano de grande preocupação com os incêndios da Amazônia, o Pantanal teve o maior aumento de área queimada, com 573% a mais que em 2018, totalizando quase 14% do seu território. Já em termos de área absoluta, quem mais queimou foi o Cerrado com 148.648 km².
Aquecimento recorde nos oceanos A temperatura dos oceanos nos últimos dez anos foi a mais elevada já documentada, com 2019 batendo recorde. Além do aquecimento aumentar mais a cada ano, cresce também a velocidade desse aumento e 2019 bateu também o recorde de maior aquecimento em relação ao ano anterior. Isso é muito importante porque os oceanos absorvem mais de 90% do calor retido por conta dos gases de efeito estufa, demonstrando com mais precisão os reais efeitos do aquecimento global. Águas mais quentes também influenciam os padrões de chuva, causando mais secas em certo lugares e mais enchentes em outros.
De acordo com uma outra pesquisa, uma bolha de calor no norte do Pacífico foi responsável pela morte de quase um milhão de pássaros e um número menor de mamíferos como baleias e leões marinhos. Os animais morreram de fome por uma combinação da diminuição da oferta de organismos na base da pirâmide alimentar marítima com uma mudança no metabolismo dos peixes, que, com o calor, precisam ingerir o dobro de nutrientes.
Fórum Econômico Mundial preocupado com o clima Pela primeira vez as mudanças climáticas encabeçam ao mesmo tempo as duas listas de maiores riscos globais do Fórum Econômico Mundial. Em termos de probabilidade, questões ambientais relacionadas com o clima ocupam as 5 primeiras posições, algo também inédito. Já em termos de impacto, são 3 riscos ambientais no top 5.
O Relatório de Riscos Globais é apresentado anualmente e se baseia em um levantamento feito com a rede de relacionamentos do fórum que inclui membros da iniciativa privada, governos, sociedade civil e outra lideranças.
E a crise climática não é apenas uma preocupação a longo prazo. Embora as listas mencionadas se proponham a discutir riscos de um futuro mais amplo, o relatório também apresenta uma visão de riscos mais imediatos, pensando no ano que começa, e para 2020 já podemos ver uma grande preocupação com os efeitos das mudanças no clima.
Blackrock também vê os riscos Em sua carta anual à CEOs, Larry Fink, presidente e fundador da maior gestora de investimentos do mundo, alerta sobre os riscos financeiros da crise climática e fala em se ter como objetivo um capitalismo mais inclusivo e sustentável, responsável e transparente. Ele ainda promete “uma série de iniciativas para posicionar a sustentabilidade no coração da sua estratégia de investimento” o que inclui não investir mais em projetos de produção de carvão.
É motivo para comemorar pois passa uma boa mensagem e fala diretamente com aqueles com maior poder financeiro, mas a verdade é que a indústria do carvão já não andava muito lucrativa mesmo e a Blackrock não apresentou nenhum plano para cortar o investimento em outros combustíveis fósseis, devendo continuar sendo uma das maiores investidoras do mundo nesse setor.
Desastres da semana
O clima impacta os vulcões? O vulcão Taal, nas Filipinas, começou a entrar em erupção no domingo cobrindo a região de cinzas e fumaça e em seguida liberando também lava e causando inúmeros tremores durante toda a semana. Mais de 50 mil pessoas foram evacuadas e seguem com a recomendação de não retornarem pois novas erupções são prováveis.
Isso me fez pensar será que erupções tem alguma relação com as mudanças climáticas?
Uma pesquisa de 2017 sugere que com um aumento da temperatura é possível que veremos mais erupções vulcânicas e isso seria culpa do derretimento das geleiras. A pesquisa analisou o histórico de erupções na Islândia há milhares de anos e notou que quando maior a cobertura de gelo, menor a quantidade de erupções. A hipótese deles, até agora não confirmada, é que um grande volume de gelo causa uma pressão na superfície da Terra que "segura" o magma.
Outro aspecto interessante é o que acontece após uma erupção. Quando elas são muito poderosas, uma grande quantidade de aerosóis e cinzas é enviada a estratosfera o que bloqueia a chegada do sol à superfície terrestre, causando um efeito de esfriamento do planeta que pode durar até alguns anos, mascarando (e não diminuindo!) o efeito estufa ao mesmo tempo que emite mais gases na atmosfera. Esse efeito foi visto em 1991 quando outro vulcão filipino, o monte Pinatubo, entrou em erupção.
Ciclones em Fiji O arquipélago foi atingido hoje pelo segundo ciclone em menos de três semanas. Fiji é um exemplo claro da injustiça climática, é um dos países que menos emite gases de efeito estufa mas também um dos que mais sofre suas consequências. Lá, o nível do mar já aumentou mais do que a média global tendo provocado a relocação de vilarejos inteiros já em 2014.
Algum fotógrafo aqui? A Getty Images está dando uma bolsa de $10.000 para um projeto de narrativa visual sobre a crise climática.
Por hoje é só, até semana que vem.
Nuvens do vulcão Taal. Há beleza em todo lugar.
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